domingo, 29 de março de 2009

Regionalização da TV brasileira: programação local é minoria em 58 emissoras

Por outro lado, tevês públicas dedicam espaço acima da média nacional a produções feitas em suas cidades

Somos um país de múltiplas manifestações culturais e religiosas. Somos 190 milhões de brasileiros espalhados em 27 estados, agrupados em cinco grandes regiões geográficas separadas por suas características sociais, econômicas e culturais distintas. No interior de cada uma dessas regiões estão os estados, cujas populações também guardam suas peculiaridades culturais, econômicas e sociais; que possuem diferentes maneiras de falar, de se alimentar, de viver o cotidiano.

De forma bem resumida, essa é a realidade brasileira que existe lá fora, porém não é mesma trazida pela televisão aos nossos lares diariamente, difundindo para todo o país um modelo de vida padrão fabricado no eixo Rio- São Paulo pelas grandes emissoras de TV. Tal análise se aproxima da conclusão dada por um estudo realizado pelo Observatório do Direito à Comunicação (ligado ao Coletivo Intervozes), chamado Produção Regional na TV Aberta Brasileira.

O objetivo do estudo foi medir a produção regional de programas de televisão de 58 emissoras de TV espalhadas por 11 capitais brasileiras, ou seja, saber a quantidade de programas realizados no estado da emissora que o veicula.

A pesquisa constatou um baixo índice de produção regional. Do total de emissoras de TV analisadas, o tempo médio dedicado à exibição de programas produzidos localmente foi de 10,83%. Com 50% de sua programação reservados a conteúdos produzidos em sua cidade está a Paraná Educativa, emissora pública, campeã no percentual de produções regionais. Os demais destaques são a TV Rondon de Cuiabá (MT), afiliada à Rede TV!, com 45%; a Rede Minas, emissora pública, com 34,32%; a TV Pampa, afiliada à RedeTV!, com 26,5%; e a TVE-RS, emissora pública, com 22,82%.

São as emissoras públicas as mais preocupadas em veicular programas regionais. Em média, 25,5% da grade de programação das televisões públicas presentes no estudo destinam-se a conteúdos elaborados nas cidades das emissoras. Em segundo lugar estão as afiliadas à Rede TV! (12,20%), Record (11,20%), CNT (9,21%), SBT (8,60%), Band (8,56%), e por último a Globo (7%).

Na contramão das emissoras educativas, as tevês de cunho comercial estão abaixo da média nacional quanto ao espaço reservado à produção de conteúdo regional, apenas 9,14%. O estudo constatou ainda que as emissoras próprias das cabeças-de-rede (geradoras de programação nacional) localizadas em grandes centros, como Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Brasília e Recife, concedem espaços insignificantes às produções locais dessas cidades. Nesse sentido, a emissora mais rígida é a Rede Globo.

Entre as grandes regiões brasileiras, o Sul e o Centro-Oeste estão em evidência no quesito regionalização da produção de TV: 13,92% para a primeira e 11,66% para a segunda. Norte, Nordeste e Sudeste aparecem na pesquisa com índices abaixo da média nacional, que é de 10,83%.

O estudo do Observatório do Direito à Comunicação vem provar o desrespeito e a indiferença das emissoras que compõem o sistema privado de televisão no Brasil quanto à importância da regionalização da programação da TV brasileira. Algo expresso na Constituição brasileira de 1988, em seu artigo 221 (abaixo), porém até hoje desprovido de regulamentação por uma lei específica:

A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:

I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;
II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação;
III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;
IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

A atual estrutura vertical criada pelo modelo perverso de afiliação, no qual centenas de emissoras locais se submetem às ordens das grandes redes de TV, reduz drasticamente a possibilidade de se fomentar produções regionais que valorizem a cultura por meio de produções das próprias emissoras locais ou de conteúdos independentes (neste último caso, ficam de fora os programas religiosos e de televendas).

Esse quadro precisa ser consertado por uma legislação mais rígida que possa cuidar, ao mesmo tempo, da regionalização do conteúdo e do rompimento do atual modelo de afiliação entre emissoras locais e geradoras nacionais de programação (cabeças-de-rede), impondo normas rígidas para tal prática, que só amplia o cenário de concentração da cadeia produtiva dos meios de comunicação.

Até a próxima!

domingo, 15 de março de 2009

Há algo de podre no reino da Classificação Indicativa da TV

Qualquer cidadão ou cidadã que assiste à televisão aberta pode observar que nos programas veiculados em todas as emissoras é exibido, bem no canto da tela, um pequeno selo que traz, em separado, os números 10, 12, 14, 16 e 18, além da letra L; e que antes de cada atração entrar no ar aparece uma vinheta, contendo a mesma numeração, acompanhada por uma mensagem que indica a natureza e as características do conteúdo a ser exibido.

É a Classificação Indicativa. Os números informam a faixa etária limite recomendada para cada programa, e a letra L, de Livre, mostra que o conteúdo a ser veiculado não tem restrições de idade.

O assunto já foi tratado neste blog ano passado, porém, de lá pra cá, certas aberrações andam acontecendo com esse indispensável instrumento de informação e de defesa para a criança, o adolescente e a família brasileira ligados na TV. Uma delas refere-se às aparições, no mínimo, equivocadas da classificação indicativa.

Um exemplo são as chamadas das atrações exibidas ao longo da programação de todas as emissoras de TV. Em pleno horário considerado Livre, espaço geralmente dedicado ao conteúdo infantil (período da manhã ou da tarde), é comum presenciarmos nos intervalos anúncios de programas cujos conteúdos não são recomendáveis a indivíduos menores de 12, 14, 16 ou 18 anos de idade, conforme determina as regras da Classificação Indicativa.

Não é estranho que, nos intervalos de um programa voltado para o público infantil, crianças e adolescentes estejam expostos às chamadas de novelas ou de filmes que trazem conteúdos inadequados a suas faixas etárias?

Sobre isso, um caso é emblemático. Durante a exibição da novela Pantanal, no SBT, os apresentadores mirins do programa infantil Bom Dia & Cia conclamavam ao seu público (a maioria, sem dúvida, formada por crianças e adolescentes) a assistirem à novela que, na época, estava na categoria de “não recomendada para menores de 16 anos”, ou seja, não poderia ser exibida antes das 22 horas. Eles empregavam a seguinte frase no convite: “Não esqueçam: depois da novela da Globo, a Favorita, troque de canal e assista Pantanal”. É esse tipo de aberração que ocorre diariamente na televisão, mas que a Portaria Nº 1.220, editada pelo Ministério da Justiça em 2007 e que cria a Classificação Indicativa, não contempla.

O mesmo SBT anuncia exaustivamente suas sessões de cinema, com filmes que esbanjam violência e sexo, durante o período considerado Livre para o público na programação, ou seja, quando não deveria haver riscos de crianças e adolescentes ficarem expostos a conteúdos inadequados para suas idades. Mas a prática não é, definitivamente, uma exclusividade da emissora de Silvio Santos. Band, Rede TV!, Record, Globo e até mesmo a TV Brasil (emissora pública) seguem o mesmo (des)caminho.

E por falar nisso, violência e sexo foram os critérios utilizados para criar as categorias de Classificação Indicativa, quais são: L (Programa Livre para todos os públicos); 10 (Programa não recomendado para menores de 10 anos); 12 (Programa não recomendado para menores de 12 anos); 14 (Programa não recomendado para menores de 14 anos); 16 (Programa não recomendado para menores de 16 anos por conter cenas de sexo e/ou violência); e 18 (Programa não recomendado para menores de 18 anos por conter cenas de sexo e/ou violência).

Retornando ao assunto principal deste artigo, um caso também intrigante, assim como o do Bom dia & Cia, vem acontecendo com as chamadas do Big Brother Brasil 9 (BBB 9). Ao longo de todo o dia, em qualquer horário, a Rede Globo exibe flashes (pequenas matérias) para anunciar o reality show. A chamada consiste num “repórter” abordando pessoas nas ruas para que respondam perguntas referentes ao programa. Durante a tal chamada é exibido no canto do vídeo o número 10, o qual estranhamente classifica aquele anúncio apenas como não recomendado para menores de 10 anos.

O fato a ser questionado é que Big Brother Brasil 9 recebeu, na verdade, a classificação indicativa de “não recomendado para menores de 14 anos” (basta observar quando o programa começa), o que, a considerar a vinculação entre faixa etária e categorias de classificação indicativa, o conteúdo referente a esse atração deveria ser exibido após às 21 horas. Por que, então, os programetes com o objetivo de anunciar o BBB 9 são veiculados à vontade e em horário considerado Livre para todos os públicos? E por que tais flashes sobre o programa são exibidos com a indicação de faixa etária de 10 anos, sendo que a recomendada para o Big Brother é acima de 14 anos?

Sobre essa anomalia, o artigo 21 da Portaria 1.220, que cria as normas para a Classificação Indicativa dos programas televisivos, determina que: Os trailers, chamadas ou congêneres referentes às obras audiovisuais televisivas devem ser veiculados indicando, em versão simplificada [apenas o número], a classificação do produto principal. O que significa dizer que as chamadas referentes ao Big Brother Brasil 9 descumprem as normas da Classificação Indicativa.

Vale lembrar que todo cidadão e cidadã pode e deve observar os desrespeitos cometidos na programação exibida pelas emissoras de TV no que diz respeito ao cumprimento da Classificação Indicativa. A norma que implantou este importante instrumento de cidadania e de proteção para as crianças e os adolescentes afirma que todos os brasileiros têm legitimidade para monitorar o conteúdo veiculado na TV e, se necessário, encaminhar suas denúncias ao Ministério da Justiça, ao Poder Judiciário de sua região, ao Ministério Público, ao Conselho Tutelar e ao Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA).

Uma nova TV só se faz com participação! Se não mudamos nós, a mídia não muda!

Saiba mais sobre a Classificação Indicativa da televisão brasileira! Acesse:

Classificação Indicativa na TV: respeito e informação à sociedade
Até a próxima!

sábado, 7 de março de 2009

A Saga das Rádios Comunitárias no Brasil (Parte II - Final)

Lentidão para autorizar e influência política e religiosa são aspectos marcantes. Projeto de lei quer descriminalizar rádios não autorizadas, mas impõe inúmeras sanções ao funcionamento

Morosidade nos processos de autorização geram criminalização
Pouco mais de 3.600 emissoras foram legalizadas no Brasil em dez anos de regulamentação do serviço. Por outro lado, mais de 13 mil entidades aguardam autorização ou operam uma rádio sem tê-la, o que as torna ilegais e sujeitas à apreensão de equipamentos e à prisão dos responsáveis.

De acordo com entidades que militam em favor das rádios comunitárias e por mudanças na legislação do setor, o número de emissoras fechadas pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e a Polícia Federal é assustador, o que revela o grau de perseguição e criminalização que pesa contra milhares de emissoras em todo o país.

Se em 10 anos de legislação pouco menos de 4 mil rádios comunitárias foram autorizadas a funcionar, por outro lado mais de 6 mil emissoras tiveram suas vozes caladas em apenas 5 anos. Tudo isso graças à implacável perseguição do poder concedente (Governo Federal) e ao trabalho constante de criminalização da grande mídia privada, que insiste em demonizar as emissoras comunitárias fazendo uso generalizado do termo “rádio pirata”.

Tal denominação refere-se às rádios que operam sem autorização, o que mesmo assim não justifica o terrorismo, já que muitas delas funcionam nessa situação em virtude da morosidade do Governo Federal em aprovar as licenças para a exploração do serviço. Inclusive, na guerra contra as emissoras comunitárias, vale até mesmo lançar mão de mentiras que, de tão repetidas, hoje tornaram-se quase “verdades” absolutas, como a que diz que “rádio pirata” (leia-se rádio comunitária) derruba avião.

Considerando o raio de alcance restrito e escasso de sinal, bem como a potência ínfima de 25 watts, ao contrário das rádios comerciais, que têm extensa cobertura de sinal e grande potência, fica difícil acreditar na possibilidade de interferências na comunicação entre torre de controle e aeronaves provocadas pela transmissão de uma rádio comunitária.

Voltando ao assunto deste tópico, a pesquisa Rádios Comunitárias: Coronelismo Eletrônico de Novo Tipo (veja na seção Estudos da Mídia), de Venício A. de Lima e Cristiano Aguiar Lopes, revela até onde pode chegar a lentidão dos processos de autorização de uma rádio comunitária. De janeiro de 1999 a dezembro de 2002, ou seja, num intervalo de 4 anos, período que compreende o segundo governo de Fernando Henrique Cardoso, foram autorizadas pelo Poder Executivo um total de apenas 1704 rádios comunitárias em todo o Brasil.

De Janeiro de 2003 a dezembro de 2004, primeira metade do mandato inicial do atual presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, foram autorizadas 501 emissoras comunitárias no país. Na média, uma quantidade bem abaixo da observada durante os quatro últimos anos de governo FHC.

Tal situação é alvo da grande maioria dos protestos oriundos das organizações ligadas ao setor, que exigem mais agilidade do Governo Federal nos processos de autorização das emissoras, os quais muitas vezes se arrastam por quase cinco anos. Prova disso foi um levantamento realizado pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados, instância responsável por aprovar ou não os processos de autorização dos diferentes serviços de radiodifusão oriundos do Poder Executivo.

O trabalho produzido em 2007 constatou que a variação dos prazos na tramitação de processos de rádio comunitária no Poder Executivo (Ministério das Comunicações e Casa Civil) no ano de 2006 foi de 60 dias a 1301 dias (ou 3,6 anos), enquanto que na CCTCI e na Comissão de Constituição e Justiça (CCJC) da Câmara, e na Comissão de Educação do Senado (ambos do Poder Legislativo) o tempo médio de tramitação dos pedidos de autorização oscilou numa média de 80 dias. Isso significa que é no Poder Executivo onde o mal da morosidade na avaliação dos pedidos de rádio comunitária se acomoda.

Influência de políticos e igrejas em emissoras é significativa
Como afirmado anteriormente, foram autorizadas para todo o Brasil 2.205 outorgas de rádios comunitárias entre 1999 e 2004. Desse total, 1.106 (50,2%) apresentam vínculos políticos e/ou religiosos, de acordo com a pesquisa Rádios Comunitárias: Coronelismo Eletrônico de Novo Tipo.

São vereadores, prefeitos e deputados estaduais, além de pastores e padres que incidem direta ou indiretamente no funcionamento das estações de rádio comunitária. O que vai de encontro ao exposto na lei que regula o setor, a qual proíbe vínculos de caráter político ou religioso para as entidades autorizadas a operar uma emissora e também impede o proselitismo com relação a esses dois temas.

Outro dado significativo da pesquisa que não pode passar despercebido: as entidades que têm como “padrinhos políticos” senadores ou deputados federais conseguem acelerar a aprovação de uma concessão no Ministério das Comunicações em detrimento das demais requerentes de uma rádio comunitária.

Tratamento desigual
Enquanto milhares de comunicadores populares foram cerceados em seu direito de se comunicar em 10 anos de regulamentação da radiodifusão comunitária, outras centenas de emissoras comerciais de rádio e TV operam na total ilegalidade.

São emissoras que funcionam com o prazo de outorga vencido em mais de 10 ou 15 anos, desrespeitando as determinações da legislação em vigor, e que, ao mesmo tempo, não concedem espaço para conteúdos educativos, culturais e independentes, desrespeitando também o que diz a Constituição Federal de 1988.

Embora caminhem contra os princípios legais e constitucionais em vigor, o que acontece com essas emissoras de caráter comercial? Absolutamente nada! Sobre elas não incide qualquer tipo de fiscalização mais rigorosa, seja do Ministério das Comunicações (que deveria verificar o conteúdo e o serviço prestado), seja pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) (que tem a obrigação de fiscalizar a parte técnica das emissoras, bem como o uso correto do espectro de radiofrequência).

Muito menos sofrem sanções, a exemplo do que acontece com as rádios comunitárias sem autorização, cujos operadores podem ser condenados a prisão por um período de dois a quatro anos, pena ampliada pela metade caso haja danos a terceiros, além de multa. É o que diz a lei 9.472, de 1997, conhecida como Lei Geral de Telecomunicações (LGT).

Projeto do Governo modifica lei da radiodifusão comunitária
Está sob a análise da Câmara dos Deputados o projeto de lei 4573/09, oriundo do Governo Federal, que traz alterações no artigo 21 da lei 9.612/98 e ainda retira da incidência do Código Penal o crime de operar radiodifusão de forma irregular.

Como já mencionado acima, a sanção de dois a quatro anos de reclusão contida na legislação de telecomunicações (lei 9.472/97) também vale para a radiodifusão (rádio e TV). No entanto, com o projeto que tramita no Congresso, tal dispositivo não se aplicaria mais à radiodifusão. A justificativa é de que os serviços de telecomunicações e de radiodifusão foram separados com a Emenda Nº 8, de 1995.

Por outro lado, ao modificar a lei 9.612/98 (que regulamenta o funcionamento das rádios comunitárias), o PL 4573/09 impõe várias sanções de caráter administrativo às emissoras comunitárias autorizadas. Segundo o projeto, passam a ser infrações sujeitas à advertência e multa veicular publicidade ou propaganda, infringir qualquer dispositivo da lei de radiodifusão comunitária e, caso persistam tais irregularidades, cabe a suspensão do funcionamento da rádio por um período de 30 dias.

Pelo projeto de lei, a entidade autorizada a operar uma rádio comunitária que usar equipamentos que desrespeitem as especificações do Poder Concedente comete infração grave, que pode levar à multa e, em caso de a irregularidade se repetir, sofrerá multa e lacração dos equipamentos até que os problemas sejam resolvidos.

Classificadas como infrações gravíssimas estão a transferência para terceiros os direitos e os procedimentos da rádio comunitária, a prática de proselitismo de qualquer natureza e deixar a transmissão fora do ar por 30 dias sem justificativa.

Operar uma estação comunitária de rádio sem autorização do Ministério das Comunicações deixa de ser crime, mas pelo projeto de lei tal prática passa a ser infração gravíssima, sujeita à apreensão dos equipamentos, multa e suspensão do processo de autorização de outorga. A entidade nessa situação pode ainda ficar impedida de se habilitar novamente até que a multa imposta seja sanada.

Para o Governo, operar uma rádio comunitária sem autorização pode não ser mais considerado crime, mas ao se avaliar o conteúdo do projeto de lei 4573/09, parece ser uma atividade, no mínimo, muito perigosa para a sociedade, a contar as infrações e suas respectivas sanções aplicadas.

Pelo direito da população em se comunicar
A rádio comunitária é um dos instrumentos que melhor refletem a democratização da mídia no Brasil e legitimam o direito à comunicação em nossa sociedade.

Por isso, torna-se indispensável facilitar e ampliar o funcionamento dessas emissoras e destacar o papel delas na democratização da informação (tanto em relação ao acesso quanto à produção de conteúdos). E não é criando sanções e outros obstáculos que isso vai acontecer.

O Estado brasileiro, agente concedente e regulador desse serviço, deve pautar suas ações nesse sentido, agilizando a análise dos pedidos de outorga, ao invés de impor limites e mais limites às entidades que operam ou desejam explorar uma rádio comunitária.

Saiba mais:

-
Rádios Comunitárias: Coronelismo Eletrônico de Novo Tipo
- Ministério das Comunicações

domingo, 1 de março de 2009

A Saga das Rádios Comunitárias no Brasil (Parte I)


Veículo de comunicação popular tenta ser firmar como voz das comunidades e instrumento de cidadania, porém enfrenta legislação restritiva

Em um encontro que reuniu vereadores de todo o Brasil mês passado em Brasília, o ministro das Comunicações Hélio Costa fez um apelo a todos os parlamentares para que divulgassem a importância das rádios comunitárias em seus municípios. Mas será que o maior problema desse segmento de radiodifusão é (apenas) a falta de divulgação para a sociedade?

Os obstáculos enfrentados pelas emissoras de rádios comunitárias no país vão muito mais além, e englobam desde uma legislação restritiva, lentidão na análise dos pedidos de autorização até as perseguições por autoridades reguladoras e policiais. Mas antes, na primeira parte deste artigo, vamos explicar o que é uma Rádio Comunitária, qual o processo de criação de uma estação desse tipo, quais os caminhos percorridos até a autorização do serviço e ainda destacar as restrições impostas pela lei que regulamenta o setor.

Definição e propósitos
Rádio Comunitária é uma emissora que opera em freqüência modulada (FM), em baixa potência (máximo de 25 watts) e cobertura restrita a um bairro, outorgada exclusivamente a fundações e associações comunitárias, sem fins lucrativos, com sede na localidade de prestação do serviço. O prazo para operação de uma emissora é de 10 anos, podendo ser renovado por mais 10 caso a entidade tenha cumprido com as obrigações contidas na lei que rege o setor.

As rádios comunitárias devem funcionar com a finalidade de promover a integração e a melhoria da qualidade de vida das comunidades onde atuam, através de informação direcionada à cidadania e ao interesse público; além de constituir um espaço para a divulgação da cultura local e para o debate das diversas demandas no âmbito de cada comunidade. Não é permitido às rádios comunitárias utilizarem seu espaço para fazer proselitismo político ou religioso, mas sim devem estar abertas à diversidade de opiniões e vertentes de pensamento dos moradores.


Como requerer uma rádio comunitária
A entidade que quiser prestar o serviço de rádio comunitária deve encaminhar um formulário chamado Demonstração de Interesse ao Ministério das Comunicações que, sem seguida, publicará um Aviso de Habilitação no Diário Oficial da União.

O Aviso indica as localidades que dispõem de canal para prestar o serviço, o que permite que outras entidades da mesma localidade se interessem e solicitem uma rádio. Cada entidade deve apresentar documentação num prazo de 45 dias após a publicação do Aviso de Habilitação que contemplou sua cidade.

A partir da documentação, serão escolhidas as entidades aptas a executarem o serviço (a documentação necessária pode ser conferida na página do Ministério das Comunicações. O órgão, então, publicará uma portaria autorizando a prestação do serviço e, em seguida, será emitida a licença para o funcionamento da rádio.

Caminhos para a autorização
É indispensável conhecer também que caminhos tomam os processos de autorização. Iniciam-se os trâmites no Ministério das Comunicações. Em seguida, os processos vão para a Presidência da República (Casa Civil/Secretaria de Relações Institucionais).

De lá, seguem então para o Congresso Nacional, para serem apreciados pela Câmara dos Deputados e Senado Federal (comissões obrigatórias e específicas). Por último, é assinado um decreto legislativo pelo presidente do Congresso Nacional e, posteriormente, é publicado o ato de outorga no Diário Oficial da União.

Legislação mais restringe que estimula rádios comunitárias
O cenário desenhado acima parece um tanto utópico, porém indispensável para o cumprimento dos objetivos de uma verdadeira rádio comunitária. Esse tipo de radiodifusão foi reconhecido legalmente no Brasil há 10 anos pela lei 9.612, de 1998. Legislação que, no entendimento de importantes entidades da sociedade civil que atuam no segmento, como a Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço) e a Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc), mais proíbe e pune do que estimula e promove o serviço de radiodifusão comunitária.

E são vários os motivos para que o atual marco regulatório seja alvo de críticas. No que se refere à questão financeira, as emissoras estão impedidas divulgar publicidade em suas programações, sendo permitido apenas o apoio cultural (na forma de patrocínio) de estabelecimentos das localidades onde atuam.

Elas também estão proibidas de atuarem em rede (como acontece com as grandes emissoras de rádio e TV comerciais), exceto em situações de calamidade pública, guerras, epidemias ou em transmissões obrigatórias dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário (como a Voz do Brasil e as propagandas eleitorais, por exemplo).

A potência (25 watts) e o alcance do sinal (raio de 1 Km) destinados a uma emissora comunitária não contemplam os limites territoriais de inúmeras comunidades, como nos grandes centros urbanos, o que prejudica a cobertura e o trabalho dessas rádios.

A extensa lista de documentos a serem apresentados pelas entidades interessadas em explorar uma rádio é mais um dos inúmeros obstáculos encontrados no caminho da autorização. Após a publicação do Aviso de Habilitação, as entidades das cidades que dispõem de canal devem emitir, pelo menos, 16 documentos. Entre a papelada obrigatória, encontramos até mesmo manifestações individual e coletiva (este último, uma espécie de abaixo-assinado dos moradores da comunidade) de apoio à instalação da rádio, entre outros.

Saiba mais! Confira a
Lei 9.612, de 1998, que regulamenta a radiodifusão comunitária sonora, e também acesse toda a documentação necessária para se operar uma rádio na página do Ministério das Comunicações.

Na segunda e última parte do artigo A Saga das Rádios Comunitárias no Brasil, vamos abordar as dificuldades para a conquista de uma licença impostas pela lentidão no processo de autorização de uma emissora, saber o número de rádios autorizadas de 1999 até hoje e a quantidade de pedidos que aguardam serem avaliados pelo Poder Executivo federal. A realidade de perseguição e criminalização por parte da mídia privada e do Estado, e a influência de políticos e igrejas também serão destaque na semana seguinte.


Até a próxima!