domingo, 21 de setembro de 2008

Por uma outra mídia no Brasil (Parte II): Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social

Outra significativa contribuição da sociedade civil organizada na mobilização por mudanças democráticas na mídia brasileira vem do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social. A entidade, que iniciou suas atividades em 2002, quando reuniu profissionais e estudantes da área de Comunicação, é uma associação civil sem fins lucrativos atuando em 15 estados brasileiros.

Seu princípio norteador consiste em “transformar a comunicação em um bem público e efetivá-la como um direito humano fundamental para a realização plena da cidadania e da democracia”, como também ampliar, de forma mais radical, a participação dos diversos segmentos da população nos debates e decisões ligados à comunicação, fortalecendo, dessa forma, o espaço público referente ao assunto.

A partir da realização de três plenárias em 2002 e 2003, definiram-se os princípios e objetivos da entidade:

1- Lutar pelo estabelecimento de espaços públicos e pelo fortalecimento dos espaços públicos institucionalizados para que a sociedade civil possa legitimar-se como formuladora de uma agenda.
2- Pautar a discussão sobre democratização da comunicação em outros espaços, [...].
3- Fortalecer práticas que favoreçam a apropriação do direito à comunicação por toda a população, [...].
4- Participar da construção das políticas públicas de comunicação.
5- Criar espaços de capacitação de atores sociais, militantes e não militantes, considerando a comunicação um bem público, um direito.
6- Desenvolver conceitos de comunicação para subsidiar as práticas dos movimentos sociais e da defesa do direito à comunicação.
7- Disputar valores e pontos de vista dentro da esfera pública midiática a partir da leitura do contexto editorial e da conjuntura atual.
8- Criar espaços de referência que reúnam as experiências de comunicação “alternativa”, dando a elas mais visibilidade.
9- Construir um espaço de referência e documentação sobre a organização da comunicação e a história dos movimentos de comunicação do Brasil.
10- Capacitar movimentos para processos de comunicação autônoma.
11- Batalhar para a transformação das relações trabalhistas no universo da comunicação social.


O Intervozes considera como questões históricas e atuais imprescindíveis na efetivação do aspecto democrático e público da comunicação e do seu fortalecimento como um direito humano as seguintes propostas: o controle da propriedade e das concessões dos meios de comunicação, com o estabelecimento de limites de propriedade pela legislação; a consolidação de um sistema público de comunicação, “livre de interesses comerciais ou políticos”, e outorgar “parte das concessões a organizações da sociedade civil”, mas com a garantia de mecanismos de financiamento; e “estimular e capacitar as rádios comunitárias de baixa potência”, possibilitando um maior diálogo dos cidadãos com sua realidade.


Além disso, a entidade luta pela garantia de que os recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações* (FUST) “sejam usados na sustentação de políticas públicas de inclusão digital”, e as definições sobre o novo sistema digital para a comunicação brasileira “devem ser baseadas em decisões políticas”; pela valorização da propriedade e acesso coletivos à produção intelectual, em que “não haja apropriação privada do trabalho coletivo”, sendo essenciais “definições que obriguem o setor público a usar apenas o software livre”; pela governança da internet mundial, para que seja criado “um modelo internacionalizado e democrático”, e não privatizado; e, por fim, estimular os pequenos veículos alternativos de comunicação, fomentar a regionalização cultural, artística e jornalística das emissoras de rádio e TV e abrir maior espaço na grande mídia às produções audiovisuais independentes.

Em sua
página oficial, o Intervozes organiza seu movimento pela democratização da mídia no Brasil. Nele temos acesso a vários documentos oficiais da entidade relativos a seu trabalho de mobilização, sempre em contato direto com diversos setores da sociedade organizada que também abraçam a causa de uma mídia mais plural, ética e de múltiplas vozes.



O Intervozes ainda atua em outra frente. É o Observatório do Direito à Comunicação, um espaço dedicado a acompanhar e fiscalizar os principais acontecimentos envolvendo leis, direitos, políticas públicas e ações da sociedade civil e do poder público em que o alvo são os meios de comunicação. Sua meta é também se firmar como um espaço alternativo e propositivo na construção de uma comunicação democrática, na qual todos possam não apenas ter acesso, mas ser agentes diretos e participativos tanto na formulação de políticas públicas quanto no controle e na produção de conteúdos.

A página na internet ainda dispõe de uma vasta documentação, onde se tem acesso à legislação da comunicação brasileira e de vários países do mundo, trabalhos de pesquisa, relatórios com estudos sobre o setor, artigos de importantes estudiosos do campo da mídia e notícias sempre atuais sobre a comunicação. O Intervozes ainda lançou, em 2007, a campanha Concessões de Rádio e TV: Quem manda é Você!, motivado pelo vencimento das licenças de funcionamento das maiores redes de televisão do país (Globo, Record, SBT, Rede TV! e Band). A campanha luta por transparência e democracia na distribuição das concessões de rádio e TV pelo governo federal.




Este artigo foi elaborado a partir de informações colhidas nas páginas do movimento na internet. Na semana que vem, o Mídia Aberta fala sobre o movimento organizada em prol da ética e da qualidade na programação da TV brasileira: a campanha Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania

*O FUST foi criado pela lei nº 9.998, de 2000. Seu objetivo é arrecadar recursos a partir de contribuições das empresas que prestam serviços de telecomunicações e investi-los em projetos e programas para inclusão social e digital em regiões mais pobres na área de telecomunicações.

Conheça mais o Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social. Saiba também como ser um sócio-colaborador dessa importante entidade atuante por uma comunicação mais justa, plural e democrática:

Observatório do Direito à Comunicação

Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social

Até a próxima!

sábado, 13 de setembro de 2008

Por uma outra mídia no Brasil (Parte I) – Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC)

O propósito deste blog é abordar a mídia, ou seja, o conjunto dos meios de comunicação, de forma a evidenciar a necessidade da democratização desse setor no Brasil. E são vários os que levantam essa bandeira em todo o país desde os tempos sombrios da ditadura militar. Veio a democracia, mas ainda permaneceu o cenário obscuro e sem transparência das comunicações.

Por essa razão, no decorrer dos anos de 1990, surgiram importantes frentes na busca por políticas públicas voltadas às mudanças democráticas para a mídia, alterações na legislação e com o propósito de transformar a comunicação social em um direito humano fundamental reconhecido.

Pelo menos três iniciativas de mobilização que estão em plena atividade no Brasil merecem destaque. São elas: o
Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), o Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social e o movimento pela ética na TV Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania. Vamos começar pelo movimento que está há mais tempo na batalha por uma outra comunicação no Brasil: o FNDC.

O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) teve início ainda no ano de 1984, quando foi criada a Frente Nacional por Políticas Democráticas de Comunicação (FNPDC) que, em 1987, se estruturou de maneira informal como Movimento Nacional pela Democratização da Comunicação (MNDC).

A partir dessas experiências, quando se deflagrou um processo de reconstituição das premissas da luta pela democratização no Brasil, surge, em 1991, como movimento social e, posteriormente, em 1995, transformado em entidade constituída, o Fórum Nacional pela Democratização de Comunicação (FNDC). Em 1994, o Fórum aprovou o documento
Bases de um Programa para a Democratização da Comunicação no Brasil que, desde então, passou a orientar as ações de todo o movimento.


Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso – especialmente após o término do seu primeiro mandato – o FNDC passou por um período de estagnação devido à desvalorização dos movimentos sociais e culturais, fato que impedia o fortalecimento do Fórum, fragilizando seus comitês espalhados em diferentes estados do país. Mas, em 2001, após o processo de privatização do setor de telecomunicações, o FNDC se rearticula e, em 2002 (ano eleitoral), elabora um programa de governo direcionado para o setor de comunicação.

O FNDC, desde sua criação, atuou em frentes como a implantação do Conselho de Comunicação Social; a regulamentação da TV a Cabo; a elaboração de uma nova Lei de Imprensa e ainda a luta pela estruturação da Rede Manchete (atualmente extinta). Além dessas atuações, o Fórum esteve presente, em 2002, numa campanha contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que permitia o ingresso do capital estrangeiro nas empresas de comunicação brasileiras, e também participou do processo de formulação do conceito de Rádio Comunitária.

Uma das conquistas mais significativas para o FNDC foi a criação, como manda a Constituição Federal, do Conselho de Comunicação Social, órgão consultivo do Congresso Nacional e espaço institucional com participação da sociedade civil dedicado exclusivamente aos meios de comunicação, mas atualmente desativado. Outros temas relevantes, como a digitalização da TV Aberta e a regionalização do conteúdo na TV brasileira também marcaram a atuação do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação em sua história.

É preocupação do FNDC formar uma sociedade participativa nas questões que afligem a mídia e também na proposição de mudanças para a atual realidade dos meios de comunicação. Ao mesmo tempo, cobrar do Estado (poder público) a mesma postura. A entidade considera que a comunicação de massa (rádio, TV, imprensa) tem importância estratégica para o efetivo exercício da democracia, da cidadania e da soberania de um país.

O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação mantém uma página na internet, onde podemos encontrar estudos, pesquisas, notícias relacionadas aos meios de comunicação, além de inúmeras publicações disponíveis para download, como a revista Mídia Com Democracia. E quem se interessar, pode ainda fazer um cadastro rápido e fácil para receber, por e-mail, o boletim semanal E-Fórum e o serviço de clipping, com as principais informações relativas à mídia no Brasil e no mundo.

Este artigo foi baseado em informações colhidas na página da entidade na internet e na revista Mídia Com Democracia, com edições disponíveis para baixar. Na semana que vem, o Mídia Aberta será dedicado ao Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social.

Até a próxima!

domingo, 7 de setembro de 2008

Em evento histórico, Bahia sediou a 1ª Conferência de Comunicação Social no Brasil

A realização de uma Conferência Nacional de Comunicação Social, com convocação do Governo Federal, é atualmente a maior bandeira daqueles que atuam em favor de uma mídia mais democrática, plural e inclusiva.

A exemplo do que já foi mostrado neste blog em outro artigo sobre o tema, a principal meta dos movimentos pela democratização da comunicação no Brasil é construir uma conferência em âmbito nacional, porém antecipada com etapas estaduais e/ou municipais, assim como acontece em outras áreas. O intuito é garantir uma maior participação dos diversos segmentos da sociedade e, com isso, levar propostas de políticas públicas ao encontro nacional que, por enquanto, não é unanimidade em Brasília.

Ministério da Cultura, comissões de Direitos Humanos e de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados e a Empresa Brasil de Comunicação (empresa mantenedora da TV Brasil) são as únicas instituições que demonstraram publicamente total apoio à realização, o mais breve possível, da 1ª Conferência Nacional de Comunicação no Brasil.

Enquanto a edição nacional não acontece, alguns estados já começaram a se mobilizar em torno do debate pela democracia na mídia brasileira. E quem saiu na frente foi a Bahia, que realizou nos dias 14, 15 e 16 de agosto a sua 1ª Conferência de Comunicação Social. E ainda para 2008, outros estados já se mobilizam no sentido de realizarem novos encontros e fortalecerem de vez essa corrente por um grande debate nacional.


Em seguida, leiam, na íntegra, a Carta da 1ª Conferência de Comunicação Social da Bahia.

CARTA DA 1ª CONFERÊNCIA DE
COMUNICAÇÃO SOCIAL DA BAHIA

Há entre nós, realizadores da 1ª Conferência de Comunicação Social da Bahia, a consciência de que o diálogo entre o governo e os movimentos sociais, e noutra dimensão, entre o Estado e a Sociedade como um todo, é condição social necessária para que as práticas da democracia sejam consensuais nas redes de transmissão de informações, nas trocas culturais e nos processos de (re)produção dos discursos que modelam a vida política, social e cultural nas comunidades, nos territórios de identidade, no estado e no país.

Sem a prática da livre produção social de conteúdos nas escolas, nos portais, nas salas virtuais, nos jornais, nas revistas, no cinema, nas rádios e televisões, isto é, sem a democracia na comunicação, não nos produzimos como seres sociais políticos - cidadãos e cidadãs – capazes de pensar coletivamente e dialogar com os nossos representantes nas esferas e instâncias do Estado Brasileiro.

Democratizar a comunicação significa reconhecer as identidades, trajetórias e condições sociais e políticas que caracterizam o povo baiano, garantindo a diversidade em todas as suas dimensões. A Bahia com seus 417 municípios congrega uma multiplicidade de saberes, histórias, personagens, valores e crenças que apenas uma comunicação democrática e plural é capaz de visibilizar e contextualizar, permitindo o resgate e valorização da memória das comunidades, territórios e povos, assim como a construção ou re-significação de outras identidades.

Não é possível pensar na comunicação no contexto contemporâneo sem as novas tecnologias, que permitiram ultrapassar o modelo distributivo para que todos os cidadãos e cidadãs tenham acesso aos meios para se tornarem também comunicadores e comunicadoras. Um modelo de inclusão sócio-digital democrático implica na apropriação das Tecnologias da Informação e da Comunicação por parte de todas as pessoas, com investimento educacional para que possam fazer dela usos criativos, com gestão compartilhada dos espaços públicos de inclusão e incentivo para a produção independente de conteúdos.

A comunicação como expressão de uma pluralidade de vozes encerra também um processo educativo, em que os indivíduos desenvolvem a mediação de suas relações sociais e possam materializá-las em diversos produtos, processos e estratégias comunicacionais. Assim, ela tem estreita relação com a educação na construção ou afirmação dos referenciais simbólicos e culturais dos cidadãos e cidadãs. A leitura crítica da mídia e a aprendizagem das pessoas para se apropriarem, produzirem e difundirem saber e informação são fundamentais para garantir uma comunicação e uma educação contextualizadas e democráticas.

A Bahia de Todos Nós é expressão de um momento novo, singular na sua história, onde o governo e a sociedade civil buscam, através do diálogo, isto é, da comunicação, materializada nos modos, na partilha social como estratégia, nas redes de ouvidorias e nos mecanismos institucionais democráticos que permitem aos cidadãos e cidadãs não apenas serem ouvidos, mas exercerem a condição de atores dos processos de elaboração, execução e avaliação das políticas públicas democráticas.

Esta é a razão pela qual mais de duas mil pessoas em oito plenárias territoriais, envolvendo 26 Territórios de Identidade e seus 247 representantes, seguidos de observadores e convidados regionais e nacionais, discutem, nesta 1ª Conferência de Comunicação Social da Bahia, as políticas públicas democráticas, em quatro vertentes temáticas, e como o Estado deve ser estruturado democraticamente para incorporar as contribuições das representações sociais, sobretudo populares, nas políticas e nos órgãos da administração direta e descentralizada.

Deste modo, garante a todos e todas amplas esferas públicas de participação nos processos de produção das políticas públicas para além da comunicação, porque sem os meios públicos de produção da comunicação, sob gestão do Estado ou da Sociedade, não teremos como inserir os setores populares na gestão participativa das políticas de cultura, ciência e tecnologia, educação, desenvolvimento urbano e regional, emprego e renda, combate à pobreza, justiça e direitos humanos, saúde e demais políticas públicas no contexto de um Estado que se propõe republicano e democrático.

Sabemos que com a vontade política partilhada de democratizar a comunicação, as estruturas de Estado e a Sociedade, simultaneamente, terminamos colocando a Bahia na vanguarda da discussão da política pública democrática de comunicação no país, em sendo o primeiro Estado a realizar um evento desta natureza. Todavia, há uma esperança, fruto das lutas e pressões que os movimentos sociais têm exercido na esfera federal, para que este ciclo de conferências se complete com a convocação urgente da Conferência Nacional de Comunicação.

Neste sentido, os representantes desta 1ª Conferência Estadual de Comunicação - dispostos a se reunirem quando se fizer necessário de acordo com o cronograma, temário e regras do evento nacional -, se antecipam espelhando a vontade política dos baianos e baianas e o espírito de luta da sociedade brasileira por um marco regulatório e políticas públicas que, de fato, democratizem a comunicação como direito coletivo e difuso.

As contribuições inseridas nesta Carta como Resoluções, formuladas nos grupos temáticos, nas plenárias territoriais, reexaminadas e sintetizadas nesta fase estadual, serão objetos das políticas públicas democráticas de comunicação, a cargo do governo estadual com a participação da sociedade. Salvo aquelas que forem de competência exclusiva da União, das esferas do Executivo, do Legislativo ou do Judiciário, as quais têm sido bandeiras de luta dos movimentos sociais em nível nacional.

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A expectativa é de que se materialize a idéia de uma Bahia de Todos Nós, possível e necessária como obra coletiva das comunidades que integram os Territórios de Identidade do Estado da Bahia. Democratizar é garantir o direito de todos e todas.


Salvador, 14 a 16 de agosto de 2008