sábado, 25 de outubro de 2008

Constituição Federal 20 anos: Em duas décadas de vigência, Carta Magna não promoveu mudanças democráticas para as comunicações

A Constituição Federal completa em 2008 vinte anos de existência. Pelo menos no âmbito da Comunicação Social, que ganhou um capítulo próprio, razões para se comemorar a data infelizmente são poucas. Ao contrário, o momento nos convida à reflexão acerca do que (não) mudou, de 1988 até os dias atuais, no campo dos meios de comunicação no Brasil.

Dos artigos 220 ao 224, dedicados à Comunicação Social, foram pensados, segundo relatam estudiosos do setor, sob o foco dos interesses dominantes de empresários da mídia e de políticos radiodifusores e/ou ligados às grandes redes de TV. Prova disso são os parágrafos 2º, 3º e 4º (Art. 223), os quais trazem impeditivos para um controle maior, por parte da sociedade, dos meios de radiodifusão (rádio e TV), que são concessões públicas.

Por exemplo, o parágrafo 2º diz que depende da votação nominal de dois quintos do Congresso Nacional a não renovação de uma outorga de rádio e TV. A contar que centenas de parlamentares – entre senadores e deputados federais – controlam diretamente, ou através de familiares, emissoras de rádio e televisão, a Constituição não foi tão benéfica ao incluir o Senado e a Câmara dos Deputados como instâncias decisivas no processo de outorga e renovação de concessões de radiodifusão, conforme determina o parágrafo 3º.

Já o parágrafo 4º estabelece que apenas por decisão judicial é possível cancelar uma concessão de rádio e TV. Ao se avaliar o número de emissoras que funcionam com o prazo de outorga vencido, sob o comando de políticos, a forma como essas empresas desrespeitam o que determina a Constituição em relação ao conteúdo produzido e à concentração dos meios em poucos grupos, o item em questão representa um considerável revés a um controle eficaz das concessões tanto por parte do poder concedente quanto da sociedade.

Itens de suma importância como o parágrafo 5º (Art. 220), que proíbe a prática de monopólio e oligopólio nos meios de comunicação; e todo o artigo 221, que destaca os princípios a serem seguidos pelas emissoras de rádio e TV em suas programações, como o de privilegiar um conteúdo de cunho educativo, informativo e cultural e valorizar produções regionais e independentes, carecem de regulamentação por lei específica.
.
Não podemos esquecer ainda do artigo 224, que permitia a criação do Conselho de Comunicação Social, um órgão de caráter meramente consultivo, ligado ao Senado, indo de encontro aos anseios dos que lutavam por um espaço democrático, independente e com poder decisório sobre as demandas da comunicação no País. Hoje, o Conselho encontra-se parado, sem se reunir desde 2006 por falta de vontade politica do Congresso Nacional para escolher a nova composição e, principalmente, pela falta de compromisso de boa parte dos nossos parlamentares em discutir de forma transparente e democrática o sistema de mídia no Brasil.

Nesses 20 anos de presença da comunicação social na Carta Magna, as poucas alterações feitas no espaço dedicado ao setor não contribuíram em nada para a democratização da mídia no Brasil. Em 2002, durante a gestão de Fernando Henrique Cardoso na presidência da República e num contexto de forte crise financeira dos grupos de mídia, foi aprovada a Emenda Constitucional (EC) 36, que permitiu a participação de pessoa jurídica, ou seja, de empresas, nas emissoras de radiodifusão (rádio e TV), prática até então vedada pela própria Constituição Federal.

Outra mudança a partir da mesma EC 36 foi a permissão para o ingresso de capital estrangeiro nos veículos de comunicação (Lei nº 10.610, de 2002), o que também era proibido. Era mais uma medida tomada às pressas como forma de socorrer financeiramente as empresas de mídia e que favorecia tão somente os barões da comunicação televisiva e radiofônica e também os jornalões.

Lá se vão duas décadas de uma Constituição distante e indiferente aos anseios por transformações democráticas no sistema de mídia brasileiro. Como serão os próximos 20 anos? Fica no ar a reflexão! A seguir, a íntegra do capítulo constitucional dedicado à Comunicação Social e suas modificações recentes.

CAPÍTULO V - DA COMUNICAÇÃO SOCIAL

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

§ 3º - Compete à lei federal:

I - regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada;

II - estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente.

§ 4º - A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso.

§ 5º - Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio.

§ 6º - A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade.

Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:

I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;

II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação;

III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;

IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

Art. 222. A propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens é privativa de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, ou de pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

§ 1º Em qualquer caso, pelo menos setenta por cento do capital total e do capital votante das empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens deverá pertencer, direta ou indiretamente, a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, que exercerão obrigatoriamente a gestão das atividades e estabelecerão o conteúdo da programação.
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

§ 2º A responsabilidade editorial e as atividades de seleção e direção da programação veiculada são privativas de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, em qualquer meio de comunicação social. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

§ 3º Os meios de comunicação social eletrônica, independentemente da tecnologia utilizada para a prestação do serviço, deverão observar os princípios enunciados no art. 221, na forma de lei específica, que também garantirá a prioridade de profissionais brasileiros na execução de produções nacionais.
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

§ 4º Lei disciplinará a participação de capital estrangeiro nas empresas de que trata o § 1º. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

§ 5º As alterações de controle societário das empresas de que trata o § 1º serão comunicadas ao Congresso Nacional.
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

Art. 223. Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal.

§ 1º - O Congresso Nacional apreciará o ato no prazo do art. 64, § 2º e § 4º, a contar do recebimento da mensagem.

§ 2º - A não renovação da concessão ou permissão dependerá de aprovação de, no mínimo, dois quintos do Congresso Nacional, em votação nominal.

§ 3º - O ato de outorga ou renovação somente produzirá efeitos legais após deliberação do Congresso Nacional, na forma dos parágrafos anteriores.

§ 4º - O cancelamento da concessão ou permissão, antes de vencido o prazo, depende de decisão judicial.

§ 5º - O prazo da concessão ou permissão será de dez anos para as emissoras de rádio e de quinze para as de televisão.

Art. 224. Para os efeitos do disposto neste capítulo, o Congresso Nacional instituirá, como seu órgão auxiliar, o Conselho de Comunicação Social, na forma da lei.
Até a próxima!

Nenhum comentário: